FORMAÇÃO EM FOCO – Sobre as palestras do Conecta Música (Festival BR135) - DIA 2 - Parte 2


SEXTA-FEIRA (11.12.2015) – Cine Praia Grande
Palestra “Arte e Ativismo Urbano” com BAIXO RIBEIRO e MARIANA MARTINS, diretores do Instituto Choque Cultural (SP).


Parte 2 - Urbanistas comentam exposições que propuseram intervenções no espaço urbano e respondem perguntas do público.

A cidade como ambiente para o fazer artístico, configurada como um espaço em que a arte está integrada à paisagem urbana. Essa foi a abordagem da mostra De Dentro e De Fora realizada em 2011 no MASP, sob curadoria de Baixo Ribeiro, Mariana Martins e Eduardo Saretta. A mostra reuniu trabalhos de oito importantes nomes da arte urbana mundial com o objetivo de provocar no público a experiência de não saber onde a arte está e a partir dessa busca, olhar para a cidade com uma atenção ressignificada. "Ela pode estar em toda a parte, embaixo da escada, atrás do quadro ou dentro do buraco. Pode estar na sala de casa ou no meio da rua. Dentro ou fora do museu.", diz o texto de apresentação do conceito da exposição. 

Space Invader
Foi sobre a experiência com essa mostra que os urbanistas Baixo Ribeiro e Mariana Martins falaram na segunda metade da palestra Arte e Ativismo Urbano, promovida dentro da programação do fórum Conecta Música, em dezembro em São Luís. A primeira parte pode ser conferida aqui. O casal, que trabalhou na curadoria da mostra, comentou os trabalhos do artista francês Invader e da norte-americana Swoon. "A ideia da exposição desde o começo era uma coisa que a gente gosta muito de fazer: a exposição tá dentro da galeria, mas ela também tá fora porque o artista urbano é urbano! Ele consegue fazer coisas interessantes dentro da galeria, dentro do museu, mas é muito mais interessante na rua. Então a gente fez essa exposição especificamente no MASP, usando o museu e a rua. Então todos os artistas fizeram coisa dentro do ambiente do museu, mas eles saíram pra rua. O Space Invader aproveita o quadradinho do ladrilhinho, da pastilha pra fazer esse desenho pixelado como se fosse um jogo. Ele espalha esse monstrinho pela cidade em lugares bem específicos e depois faz um mapa pra você ir achando e acumulando pontos conforme você vai achando os monstrinhos", explica Mariana Martins, que comentou ainda a incrível capacidade do artista em encontrar os prédios mais pixados de São Paulo para instalar suas obras sem atropelar as intervenções existentes. "Em São Paulo ele teve a capacidade de achar realmente os prédios mais pixados e não colocar o monstrinho em cima de nenhuma pixação. Ele não atropelou pixação nenhuma, mas ele conseguiu achar onde tinha uma agenda bacana de pixação e ia lá e punha um monstrinho. Então você também começa perceber isso.", lembra Mariana. 

Artista Invader instalou um de seus monstrinhos de azulejo
(branco, no local onde seria um portal de entrada) no prédio
abandonado do INSS, em SP.
“Esse é um prédio abandonado há muitos anos [foto à esquerda]. É o prédio do INSS, que foi abandonado, foi invadido, foi desinvadido e de vez em quando mora um ladrãozinho, mas ele tava fechado há muitos anos, ele tá caindo aos pedaços numa das avenidas principais de São Paulo que é a 9 de Julho. Isso também é um descalabro urbano”, afirma Mariana Martins. “Ele também aproveitou uma coisa que é muito comum em São Paulo que é o cemitério de azulejos. São Paulo tem muitas lojas que vendem ponta de estoque, azulejos velhos, que são sempre aquelas estampas engraçadas então ele enlouqueceu e fez esse painel [foto abaixo, à direita] grande todo de azulejos, tem azulejo do Palmeiras, do São Paulo, florzinha, tem de tudo aí. De perto é muito bonito.”, comenta Mariana, sobre o painel na foto a seguir. 

Painel do artista Invader composto por azulejos variados e
 instalado na parte externa do MASP.
Para Baixo Ribeiro, se trata de um trabalho que estimula o passeio e o andar pela cidade. “Ele procurou lugares bem degradados e fez uma espécie de mapeamento de São Paulo. O interessante dessa intervenção artística é que ao mesmo tempo em que ela é muito singela, muito pequenininha e simples, não são grandes lugares, nem grande painéis, não é nada muito elaborado. É quase como uma brincadeira e depois dessas intervenções ele faz um mapa pras pessoas irem seguindo. De certa forma é um jeito, uma leitura que ele faz da cidade que as pessoas não tão acostumadas a fazer e ele faz de um jeito que estimula até a criançada a ir lá e acompanhar a brincadeira. A arte tem essa capacidade de subverter um pouco a ordem das coisas, de caminhar por uns caminhos que não são os caminhos mais óbvios e esperados e de discutir coisas que não são necessariamente fáceis de discutir assim na conversa, nas palavras. Isso foi a peça que ele fez dentro do MASP [foto à direita]. Tem um detalhe aqui: o MASP é um museu todo envidraçado e todo aberto pra cidade. E quando a gente fez a exposição dentro desse museu a gente fez questão de fazer coisas que pudessem ser vistas do lado de fora do museu. Esse é um caso muito interessante que ele fez a instalação dele, esse desenho com azulejos, de uma forma que só quem tá fora consegue ver o trabalho. Se você tá dentro do museu e vai passar pelo trabalho, você está em um corredor muito estreito, ‘cê acaba não vendo o trabalho.”, conta Baixo Ribeiro.

Vila temporária instalada pela artista Swoon
no vão livre do MASP.
Na sequência, o urbanista mostrou imagens dos trabalhos da artista norte-americana Swoon, que instalou uma vila no vão livre do MASP durante o período da mostra De Dentro e De Fora. “O interesse maior dela tá nas pessoas que moram na rua e na questão da moradia nas várias cidades, nos vários países onde ela já trabalhou. Pra exposição do MASP ela pensou no vão livre, porque é um lugar por onde passa um milhão e duzentas mil pessoas por dia e noite. É um lugar muito visitado, muito frequentado", afirma Baixo Ribeiro. Segundo ele, durante esse trabalho foi observado que além da uma quantidade expressiva de pessoas que moram nas ruas do Centro de SP, há também um contingente de pessoas que tem onde morar, mas residem tão longe do trabalho no Centro que optam por permanecer na cidade durante a semana, dormindo em albergues ou mesmo na rua e retornando para casa somente nos fins de semana. "A gente não conseguiu fazer um levantamento numérico, mas é coisa de três mil pessoas que moram na rua nessa região. Tem alguns albergues, mas tem muita gente que dorme direto na rua mesmo", conta, destacando que o trabalho da Swoon dialoga justamente com esse contexto, ao instalar uma vila temporária durante três meses para ser habitada por moradores de rua. A grande questão dessa instalação  foi configurar um espaço de moradia em pleno espaço público dialogando com órgãos como a prefeitura e a diretoria do museu, além de lidar com a polícia. A concepção da habitação da vila contou com todo um planejamento e uma mobilização prévia. "Essa artista fez um chamado, a gente
Detalhe da horta cultivada na vila temporária.
Swoon (agasalho preto) conversa
 com Baixo Ribeiro (roupa marrom).
entrou em contato com mais de cem organizações grandes e pequenas no eixo de reciclagem, mobilidade, moradia e alimentação urbana, hortas urbanas. E todas essas organizações foram mapeadas e colocadas em relação de possibilidade de trabalho em conjunto umas com as outras."
, explica Baixo Ribeiro e cita como exemplos a parceria entre os catadores de papel e um senhor que tinha uma bicicloteca, acordando que os livros recolhidos pelo pessoal da reciclagem seriam doados para a biblioteca móvel. Outra parceria firmada foi para a alimentação dos catadores de papel, que foi custeada por parte do lucro das empresas de reciclagem instaladas na região. "Resumindo, a gente fez uma cadeia de conexões e possibilidades de trabalho entre as ONG’s. Em contrapartida dessa organização que a gente fez pra eles, dessa tecnologia que a gente transferiu pra essa rede de organizações, eles ficaram de fazer um workshop por dia ou noite dentro desse espaço. Então esse espaço durante três meses teve workshops dia e noite de tudo, de yoga, de pôster, de desenho, discussões, mesas redondas sobre moradia, política e foi um período muito interessante porque além do gigantesco fluxo de pessoas que tem aí dentro, que passam por aí, tinham também as primeiras grandes passeatas que começaram em São Paulo por conta de Belo Monte, por conta da Marcha da Maconha, enfim foram muitos inícios de processo que se concentraram nesse ponto da cidade pra dar o start. Teve também essa repercussão muito interessante de público. O próprio sistema de funcionamento de sustentabilidade dessa pequena vila contava também com uma horta de chás e temperos, contava com a presença de muitas pessoas que iam fazer comida no lugar e distribuíam pras pessoas. As pessoas que moravam na rua acabaram tomando conta do lugar e acabaram participando de todas as atividades. Foram uma infinidade de eventos que foram se agregando ao núcleo inicial e com isso esse projeto se manteve pelo período que ele se propôs.”, relembra Baixo.

Ersilia, obra de Swoon para a exposição
De Dentro e De Fora (MASP, 2011).
Na sequência, Baixo Ribeiro comenta as xilogravuras feitas por Swoon em peças de linóleo, como a da foto à esquerda. "Ela faz como se fosse uma xilogravura, só que ela faz em piso, em pedaços grandes de piso de hospital, aquele piso de borracha que chama linóleo. Esse trabalho teve uma coisa importante, que eu também selecionei entre as milhões de exposições que a gente fez porque não só ele, é um trabalho que depende da cidade, ele é feito pela cidade, é feito para a cidade, ele é feito com aquele pensamento que a gente diz que é da construção humana, da arquitetura das pessoas muito mais que a arquitetura dos prédios e ele tem também um componente que eu acho que é fundamental pra hoje em dia, pra coisa mais contemporânea que eu vejo, a coisa mais atual, mais interessante, a novidade mais interessante que apareceu nos últimos tempos que é a vontade de fazer colaboração, vontade de colaborar, quer dizer, a arte deixou aí, a gente tá em contato com muita gente que participa desse pensamento, ela deixou de ser uma coisa muito vocacionada, voltada pra ela mesma e ela de alguma maneira tá muito mais voltada pra soluções de problemas, pra participar de solução de coisas, pra participar de causas, pra participar de grupos de colaboração mesmo que estejam querendo fazer alguma coisa além da própria linguagem obviamente.", analisa o urbanista.

Para saber mais sobre a exposição e conhecer os artistas que compuseram a mostra De Dentro e De Fora clique aqui.

Outro trabalho selecionado por Baixo Ribeiro para compartilhar com o público do Conecta Música foi a experiência atual da Choque Cultural na revitalização da Barra Funda, em São Paulo. Segundo Mariana Martins, a região passou por um processo de despovoamento após a desativação da linha de trem que a atravessava. Com isso, os armazéns, fábricas e demais estabelecimentos da região foram desativados resultando em um bairro com vários galpões vazios que estimulam a instalação de grandes empreendimentos imobiliários, como condomínios. O que é alvo de críticas por empregar uma solução comercial para ocupar uma região que  já conta com um patrimônio humano interessante que está sendo ignorado pelo poder público. 

Baixo retoma comentando a escolha desse trabalho em especial porque trata de resgatar o conceito de patrimônio imaterial que consiste na olhar voltado para as pessoas e a relação delas com a cidade. "Selecionei esse trabalho exatamente por isso, porque às vezes a gente dá muito mais importância para o patrimônio material do que pro patrimônio imaterial, até porque às vezes é mais fácil de você explicar o que é o patrimônio material do que o imaterial. Então a relação das pessoas, você destruir por exemplo uma comunidade inteira." e lamenta os impactos do desastre em Mariana -MG para o patrimônio humano da região citando como um evento desses desestabiliza por exemplo uma cooperativa de mulheres empreendedoras que produziam e comercializavam geleia de pimenta biquinho. "Vi um vídeo sobre as mulheres de Mariana que se juntaram pra fazer pequenos negócios. Elas estavam com um problema porque não tinham muito como trabalhar, tinham que cuidar dos filhos em casa e também não se conheciam. Elas sentiam falta desse contato entre elas na cidade. E ai começaram a conversar e isso evoluiu, se desenvolveu, foi um negócio que deu certo. Elas começaram a vender realmente a geleia e começaram a produzir mais. Essa produção atraiu mais mulheres e elas criaram uma comunidade incrível muito bem sucedida em função de que além do contato que elas começaram a promover entre elas mesmas, nas conversas, enfim no desenvolvimento da própria comunidade eles tavam ganhando dinheiro com isso, tavam desenvolvendo um trabalho com isso. Então isso se acabou, esse tipo de destruição pra mim era muito mais complicado, muito mais complexo, muito mais difícil de restaurar essas conexões, essas ligações do que casas que você vai lá e reconstrói, constrói de um jeito melhor e você até aproveita algum espaço, enfim a gente tá falando de uma tragédia, mas o que me atenta mesmo é pra questão da relação humana mesmo.”, avalia Baixo Ribeiro.

“A destruição em Bento Rodrigues foi imensa dessa relação humana, porque era uma cidade pequena, todo mundo se conhecia e tinha uma relação próxima uns com os outros e de repente a lama comeu tudo e foi cada um prum lado, um pra casa de um parente ali, outro pra casa de um parente lá, outro voltou pra Belo Horizonte e as pessoas perderam o contato, estão se sentindo completamente perdidas no espaço.”, considera Mariana Martins. 


Bar do Fagundes teve fachada reformada
pelo projeto Ponte Barra Funda
É a mesma preocupação com a rede de contatos e conexões entre as pessoas que motiva a discussão sobre o processo de transformação urbana da Barra Funda, em São Paulo.“Aqui em São Paulo nesse bairro da Barra Funda onde a gente tá fazendo esse projeto, a questão da relação humana também é muito importante porque na verdade o que você tem lá são vários moradores antigos, que moram lá há muito tempo. Você tem alguns artistas, uma comunidade envolvida com cultura que acabou indo pra lá e faz os seus estudos naqueles antigos galpões fabris e você tem uma comunidade relativamente frágil, que não tem muito tempo de união. É uma comunidade que não se desenvolveu entre si, não criou laços muito fortes, então fica muito mais fácil pra você desmontar um bairro inteiro e recriar um bairro inteiro. O fato é que lá vai ser recriado em um modelo que é muito perigoso que é um modelo de condomínio fechado. Então são prédios muito grandes, muito altos, apartamentos muito pequenos, então é um adensamento muito forte, muito grande, mas sempre fechando, sempre cercado por altos muros diminuindo o próprio ambiente do espaço público. O espaço público de uma rua quando ela se transforma numa rua pro carro passar fica um espaço público diminuído. Se você coloca um muro muito grande nessa rua ao lado de uma calçada pequenininha você ainda diminuiu mais o espaço público. É uma maneira de você perder esse espaço público, então a ideia desse trabalho é levar artistas pra esse bairro pra eles fazerem intervenções que discutem essa questão da memória, do lugar, da perda do espaço público, da desvalorização do espaço público e essa relação do antigo espaço público com as novas construções privadas.”, explica o Baixo Ribeiro.


Após a apresentação, Baixo Ribeiro comentou sobre a disponibilidade dele e Mariana Martins em compartilhar o know now da Choque Cultural com os agentes locais para o desenvolvimento do mapeamento cultural do Centro  de São Luís. No dia anterior, o casal ministrou a oficina Mapeamento Cultural Digital na programação do Conecta Música com o objetivo de criar em grupo o levantamento dos pontos e referências culturais do território local, considerando a paisagem cultural local e a memória afetiva ligada ao lugar. “Estamos aqui propondo trabalho, que o que a gente conhece, o amor que a gente tem por esse Centro Histórico e pela história de vida que tá contida aqui nesse lugar é muito bonito. Pode se desenvolver de um jeito legal." afirma Baixo, cuja crença no desenvolvimento de uma comunidade mais educada e atenta ao seu patrimônio  - material e imaterial - é um fator de estímulo para o trabalho que está sendo proposto.
 - Rapaz na plateia pergunta como se deu a formação da Choque Cultural, a articulação dos grupos que trabalharam na exposição da vila temporária e quais os desafios principais dessa união.

BAIXO: “Eu diria que a gente iniciou esse trabalho há mais ou menos uns doze anos, que foi mais ou menos quando a gente iniciou o projeto da Choque. O projeto da Choque, o início já era muito mais do que fazer uma galeria, comprar trabalho e vender. A gente nunca comprou trabalho e vendeu, a gente sempre fez uma negociação com novos negociadores, colecionadores antigos, artistas novos, mas sempre foi juntar artistas, juntar cenas, nos interessa sempre a cena artística”.

MARIANA: “Na verdade assim, tem uma coisa engraçada. Quando eu era criança eu queria ter uma boate. O Baixo quando era criança queria ter uma escola. Quando a gente juntou saiu a Choque Cultural que é meio assim uma escola-boate, entendeu? (risos) No caso dessa profissionalização eu diria de juntar os grupos, a gente aprendeu muito com essa coisa da Swoon, porque a Swoon sempre foi uma artista que nos interessou por ser uma ativista também. Ela ia fazer esse trabalho no fim do ano. Ela veio em junho ou em maio com uma advogada, uma artista plástica advogada que faz um trabalho no Brooklin em Nova York e chama 485 acres, eu nunca lembro quantos acres são, mas ela descobriu uma brecha na lei que se você entra num terreno abandonado e se você planta e colhe alguma coisa, você tem direito a esse terreno, você tem o usucapião a esse terreno. Então ela começou a mapear todos esses terrenos vazios que tinham no Brooklin e avisar as pessoas ‘você pode invadir esse lugar e fazer uma horta e colher que você vai ter direito a usar isso publicamente”, quer dizer, transformar isso num bem público, numa horta, num jardim e assim eles conseguiram fazer diversos jardins. Eles tão brigando até agora porque volta e meia alguém entra com mandado de segurança, quer tirar as pessoas de lá, mas ela tá conseguindo fazer isso e quando elas vieram em junho, já tinham feito pela internet esse mapeamento das ONG’s que interessavam realmente em reciclagem. Elas mostraram pra gente, fizeram uma pré-seleção e ai fizeram as reuniões. Teve uma série de reuniões de onde saíram outras escolhas, quem poderia trabalhar junto e quem não poderia trabalhar junto. Isso foi feito durante uns quinze dias em junho e elas voltaram em outubro, novembro e todo mundo já tinha pensado o que fazer, se organizado e aí foi feita essa construção. Tinha uma dessas construções, que era uma casa que um grupo construiu, eles tem essa técnica que eles constroem super rápido, uma casa pra pessoas sem moradia, são quatro placas de madeira, teto e fecha quase que uma caixa.”

BAIXO: “Eles fazem uma unidade de moradia por 3 mil reais. Esse é o trabalho deles e eles distribuem isso pras pessoas em lugares onde não tem outro meio, outro processo construtivo.”

MARIANA: “É, esse é uma casa, mas ela [Swoon] construiu outras coisas mais estéticas, mas esculturais, nesse meio tempo. Essa construção também demorou uns vinte dias. Nesse meio tempo a gente conheceu as pessoas que moravam ali, tinham uma japonesa que lia cartas, uma cartomante, tinha o camelô que é o cara que sempre aparece toda vez que tem manifestação, ele é o cara que dá mais opiniões sobre a política. Era uma comunidade grande que foi sendo conhecida ao longo do trabalho. O trabalho é feito de tal maneira que é importante você sempre incorporar as pessoas que vem vindo e que chegam.”


BAIXO: “A verdade é assim, que mais ou menos nessa época a gente formalizou o Instituto Choque Cultural e a gente começou a escrever essas tecnologias sociais, a gente começou a fazer conteúdos. São jeitos de fazer, modos de fazer, modos de ouvir pessoas, jeito de transformar, de criar transformações na cidade. Prototipar projetos, fazer projetos numa escala menor e depois fazer numa escala maior. Quer dizer, a gente começou a fazer uma série de metodologias de trabalho, modos de fazer essa coisa dar certo. A gente escreveu um livro chama “A Escola é Cidade – A Cidade é Escola” e tá na internet, a gente colocou o conteúdo todo livre no issuu, não sei se vocês conhecem, é uma plataforma. Quando vocês mandarem seus e-mails pra mim eu retorno com alguns links e é um livro que conta um pouco sobre a tecnologia que a gente usa nos trabalho com estudantes, com as escolas de ensino médio principalmente, que a gente faz uma formação com professores e nessa formação de professores a gente ensina eles basicamente a transformar o próprio espaço da escola junto com os seus estudantes, com os alunos e obviamente dentro desse processo entra uma série de novos instrumentos que ajudam eles. A gente ensina a trabalhar a ideia do fanzine, a ideia do grafite dentro da escola, do stêncil, a ideia da poesia transformada em cartaz, transformada em lambe-lambe, enfim, uma série de novas linguagens que são super do interesse dos estudantes, do interesse das novas gerações e que os professores não tem acesso assim como um instrumento formal de trabalho e a gente transformou isso num instrumento formal e consegue incluir no seu currículo escolar e administrar esses novos instrumentos dentro da escola. A gente tem conseguido resultados incríveis com esses alunos. A tecnologia é um jeito da gente explicar como a cidade é também um espaço de ensino-aprendizagem que às vezes a gente não percebe, mas é principalmente da aprendizagem coletiva em que a gente cria junto entre nós.”

MARIANA: “Inclusive é uma das coisas que falta muito assim, de você saber lidar com o outro, você ter essa civilidade de ter o limite e ter o limite do outro. Você ter a educação de respeitar as outras pessoas quando você anda no espaço público, você tem que respeitar. Quando você tá no teu shopping center tem um segurança que vai bater em alguém que não gosta de você, mas se você tá no espaço público todo mundo tem que se respeitar, tem que respeitar os limites de cada um."

- Senhor na plateia pergunta se o casal visitou alguma periferia de São Luís-MA.

BAIXO: “Ainda não.”

MARIANA: “Não deu tempo.”

O mesmo senhor destaca a importância das atividades culturais acontecerem de forma descentralizada em São Luís-MA.

BAIXO: “Não, não tenha dúvida. A gente sempre considerou a ideia que o centro de uma cidade geralmente é aquele lugar mais próximo de todas as periferias, mas não quer dizer que a gente não deva estar presente nas periferias. É muito importante que a gente faça sempre essa ligação. Tem que aproveitar que a gente sabe lidar com a rede já."

Encerrando, Baixo Ribeiro e Mariana Martins agradeceram a presença e participação de todos e deixaram o convite aos interessados em participar do Grupo de Trabalho que fará o mapeamento cultural do Centro de São Luís a manterem contato através do e-mail baixoribeiro@gmail.com . O GT São Luís, que começou a ser formado após o workshop Mapeamento Cultural Digital realizado pelo casal de urbanistas, tem como objetivo mapear a cultura do território em torno do Centro Histórico de São Luís, através de um grupo multidisciplinar que pesquisa e discute questões culturais locais e troca experiências em rede. 

Comentários

Renata Teixeira disse…
A brincadeira do Spacer Invader lembrou me de quando ia à banca de revista procurar o coelhinho escondido na capa da revista Playboy. Acho que o dono da banca nunca entendeu porque é que essa moça se interessa por capas de revista masculina. Fiz isso por muito tempo, hoje nem sei a revista ainda esconde o coelhinho na capa.

Que coisa mais bacana! Fazer arte para morador de rua! Deve ter sido uma experiência muito nova para essas pessoas.

Talita eu confesso que nunca tinha pensado na tragédia de Mariana por esse ponto de vista. Como gosto muito de bicho, a primeira coisa que vem na minha mente é o número gigantesco de bicho morto ou desabrigado. Nunca tinha pensado nas relações humanas que se desfizeram em função do que aconteceu.

O Baixo e a Mariana são pessoas incríveis!

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