Entrevista com Júlia Emília (Grupo Teatrodança)


Quis o destino que eu e Júlia Emília nos conhecêssemos. Mas penso que quis com afinco porque colocou-nos nos mesmos espaços em vários momentos da última década, como que só à espreita do momento em que nossas linhas da vida se tocariam. 

Quando em dezembro de 2006 participei do meu primeiro evento no mundo das letras por ocasião da festa de anúncio dos resultados do XXX Concurso Literário e Artístico em que Vila Tulipa foi premiado na categoria Contos, Júlia Emília estava lá, já veterana, sendo premiada na categoria Teatro pelo texto da peça O Baile das Lavandeiras


Com Júlia Emília na #9FeliS (out/2015)
Nos últimos dois anos nos esbarramos várias vezes nas portas de teatros e auditórios durante a FeliS, ambas com suas programações nas mãos, chegando a trocar comentários rápidos sobre quais palestras iríamos assistir para após um aceno rápido tomarmos rumos diferentes. 

Em setembro deste 2015, partilhamos da curiosidade pelo Encontro de Blogueiros promovido pelo Clube do Livro e lá fomos nós duas parar no mesmo espaço de novo. Até o mesmo Clube do Livro surgir nas nossas vidas com um convite em comum: participarmos com nossos livros de uma mesa no Encontro de Autores Contemporâneos na Feira do Livro do Shopping da Ilha. Encontro este que finalmente nos apresentou uma a outra, semeando uma amizade nova com ar de velhos conhecidos. 

Desta vez combinadas, participamos juntas de vários momentos da #9ªFeliS e foi graças à mediação de Júlia Emília que  Vila Tulipa foi parar em um dos estandes de livreiros onde a primeira edição do livro finalmente esgotou. Sim, o mesmo Vila Tulipa que lá atrás me pusera certamente pela primeira vez no mesmo ambiente festivo que a experiente dramaturga.

Júlia Emília é um ser dançante e inspirado que baila pela nossa cidade com um profundo respeito pela tradição e pela cultura popular. Seu trabalho árduo, mas espiritualmente elevado, junto ao Grupo TeatroDança, pode ser conferido no livro Vivendo TEATRODANÇA: Investigações de uma artista maranhense para crianças de qualquer idade (Halley, 2015), cuja temporada 2015 de lançamento se encerra no próximo dia 18 de dezembro (sexta-feira) às 19 horas, na Livraria Leitura São Luís Shopping. 

Lançamento do livro + intervenção
no Centro de Criatividade Odylo Costa, Filho
(nov/2015)
Na ocasião, o Grupo Teatrodança fundado por Júlia Emília há três décadas apresentará a intervenção Prece para corações cansados.

Na breve entrevista a seguir, a dramaturga Júlia Emília fala sobre a fundação do Grupo Teatrodança e os trabalhos que resultaram no livro e convida todos os corações cansados a unirem-se ao Grupo na sexta-feira 18/12.

TRÊS PERGUNTAS PARA JÚLIA EMÍLIA (GRUPO TEATRODANÇA)


1) A trajetória do Grupo Teatrodança está fundada em processos de investigação do corpo e do movimento a partir de elementos das áreas teatrais e dançantes. Conte-nos mais sobre a fundação do Grupo e como é o método de trabalho com os atores, considerados sujeitos criadores.

R: Constituído inicialmente por algumas pessoas que gostariam de apresentar ao público maranhense uma proposta diferenciada em dança que incluísse o corpo, a cena, a literatura, a música, o Grupo só conseguiu se fortalecer em 1985 com a constituição do Núcleo de Dança Oficina do Corpo com seus alunos fazendo parte e apoiando financeiramente as pesquisas da época, como “Sete saias e muitos caminhos” dança para crianças, “Poema” falando das poéticas de Bandeira Tribuzzi, “Embarcações” bianas em movimento. O trabalho com os dançarinos-atores-criadores se caracteriza pela experiência continuada e progressiva que passa pelas memórias, consciências, trânsitos e experimentações em determinados momentos das vidas de cada um ou do coletivo artístico do qual somos parte. Praticamos e estudamos em trabalho exigente porque nos colocamos à disposição da criação. 

2) O livro Vivendo TEATRODANÇA: Investigações de uma artista maranhense para crianças de qualquer idade (Halley, 2015) reúne os estudos e experimentações que resultaram nos espetáculos “Bicho Solto Buriti Bravo”, “O Baile das Lavandeiras” e “Meninos em Terras Impuras”. Como foi escrever os ensaios analíticos da dramaturgia do Grupo contidos nesta edição? E diante da possibilidade de revisitar três décadas de trabalho, por que estes três espetáculos se destacam?

R: Porque o livro “Vivendo Teatrodança” é um pequeno recorte sobre nossas experiências para o universo infantil, uma de nossas preocupações principais. Como fundadora e coordenadora do Grupo minhas trajetórias terminaram influenciando as temáticas, e como me profissionalizei no Rio de Janeiro, no final dos anos 1970, trabalhando com o Teatro Ventoforte dirigido pelo múltiplo artista Ilo Krugli, e comecei minha pedagogia com as crianças da Escola de Ballet do Clube das Mães em aulas do que chamávamos de expressão corporal, dedico para este público a sensível atenção que ele merece para reconhecer a cultura em está inserido. Nem consigo explicar como foi sofrido remexer nos baús das minhas histórias pois existem trânsitos que gostaríamos que não tivessem existido, mas consegui sobreviver aos mergulhos profundos que inclusive me fizeram repensar as nossas atuações enquanto artistas, o que nos gerou novas trilhas de experiências.  

3) A temporada de lançamento do livro foi acompanhada de intervenções que apresentavam trechos dos espetáculos registrados em conversas sobre a história do Grupo. Temporada esta que se encerra com uma nova intervenção intitulada “Prece para corações cansados”. Conte-nos como será esta intervenção em especial.

R: Quando completamos trajetórias longas ficamos cheias de histórias para contar, daí nos tornarmos dramaturgas. Embora a teoria e prática da cena não referencie mulheres na profissão estou no conjunto que briga para que seja reconhecido este nosso papel significativo para a história das artes contemporâneas. Os lançamentos, com as intervenções que os acompanham, são meios para que este reconhecimento aconteça e segue os objetivos do Grupo para inclusão de público. Iniciamos no Centro de Pesquisa de Arqueologia, passando pela Conexão Dança, Movimento Sebo no Chão, livrarias e produções artísticas retornando agora para a Livraria Leitura pelo período dos sentimentos solidários. Só que sabemos os obscuros e violentos períodos que nos atravessam. E lembrei do meado dos anos 1990 quando fizemos uma apresentação natalina em que propomos, e foi aceito, simplesmente instantes de solidariedade. Atualizamos e estamos experimentando o estar junto com alegria, sentimento que tem se tornado cada vez mais superficial. Por isso convidamos os corações cansados para estarem conosco. Porque eles estão na busca de algo mais essencial.






Comentários

Renata Teixeira disse…
Fiquei com muita vontade de conhecer a Júlia Emília. Quando ela falou sobre "remexer nos baús das minhas histórias" me trouxe à mente o solo de uma criança em meio a dançarinos adultos, numa apresentação de sapetado que assisti no início dessa semana. Foi o evento da escola de dança onde uma amiga muito especial é aluna.
Nos conhecemos em 2008 e em 2011 ela recebeu o diagnóstico de um câncer. Lutou, venceu e muitas coisas boas ficaram dessa "história no baú" da minha amiga. O sapateado - que ela começou por indicação médica - foi uma dessas coisas.
Depois da apresentação ela me contou das várias pessoas que também estavam nesse grupo de dança para superar dificuldades. Para o público que assistiu a apresentação, nada disso se percebe, apenas dançarinos brilhantes e talentosos que fazem nossas emoções saltarem!
A menininha tão magrinha e frágil (teve que fazer inúmeras cirurgias para andar, para falar, para poder se alimentar...) mas tão mais forte do que todos os outros que a rodeavam.
Tenho certeza que a prece do grupo da Júlia Emília acalenta mesmo os corações, queria muito estar ai hoje e assistir a esse espetáculo.
Que belo comentário, Renata! História tão bonita de se compartilhar. Costumo crer a vida um balé da esperança, que requer de nós força, amor e compaixão para lidar com tudo o que faz parte da existência. Fico feliz pelos belos momentos que você e sua amiga estão vivendo juntas. Todo aprendizado confere sentido a vida.
Esteja pois conosco em prece, às 19h. Sem dúvida uma bela conexão espaço-temporal bailará entre todos nós.
Amém!
Abraço grande!

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